Uma rua praticamente deserta, doze anos depois. Se encontraram por acaso. Não pensavam mais um no outro.
- Meu Deus, há quanto tempo?
- Muito - ele respondeu, a voz meio cansada, meio alterada pela ressaca.
- Muito - concordou ela.
- O que você faz por aqui?
- Vim para o show dos Stones. Você também?
- É. Mas foi meio fraco, não acha?
- Eu gostei.
- Pô, eles não tocaram nada mais antigo, do Beggar's Banquet, por exemplo.
- Você e as músicas antigas. Sempre um relógio analógico num mundo digital.
- Gostei disso. Inventou agora? - ele perguntou ironicamente, ofendido.
- Arrã. Tenho minhas tiradas.
- Todos têm o seu dia. Tá sozinha?
- Com meu marido.
- Casada? Não brinca!
- Claro que sim. Você não?
- Nem pensar.
- Nem pensou em amadurecer um pouco nesses onze, doze anos? - corrige ela rapidamente.
- Sei, casar é amadurecer. Claro.
- Não me venha com essas ironias. Pela roupa vejo que ainda sofre de Síndrome de Peter Pan. Essa camisetinha justa não fica bem na barriga de um coroa.
- Há quem goste.
- Claro, na Praça Mauá.
- Quem é o irônico, mesmo? - revida ele.
- Touché.
- E esse tal marido, te faz feliz?
- Sim, é claro.
- Como eu te fazia feliz?
- Você não me fazia feliz. Me deixava com tesão. No começo era bom, mas casal nenhum agüenta viver só trepando.
- Não me parece uma má idéia.
- Não foi a impressão que eu tive nas últimas vezes.
- Touché - ele sorriu.
Ela sorriu de volta e virou-se atendendo ao chamado de um homem mais velho, que acenava de dentro de uma minivan de luxo.
- Teu marido tá chamando. Carro de coroa o dele, hein?
- Esse é o meu. O dele é um 4x4 importado.
- Claro que é. E aposto que ele tem uma lancha também.
- Jet-ski.
- Seria minha segunda alternativa.
- Você ainda veleja?
- Cada vez mais. E ainda coleciono carros esportivos e ainda jogo videogame. Mais alguma pergunta para você medir o grau de maturidade?
- Não, nenhuma.
- E ainda trepo como quando tinha 25 anos - ele completou por conta própria no momento em que uma garota de 21 pendurou-se no braço dele, usando top e microssaia. Ela olhou com desdém para a menina, balançou um pouco a cabeça e despediu-se dos dois.
Ao entrar no carro, sentiu o gosto amargo de uísque que sempre sentia nos lábios dele, o cheiro do suor de seu umbigo, a textura de seu pêlos. Uma breve memória sensorial da vida que teve.
Ele, ao beijar a ninfetinha ao seu lado, sentiu o perfume importado que a ex-mulher usava, o gosto do seu batom e sentiu nas coxas da garota, a textura madura do passado. Lembranças da vida que não mais teria.
[Ouvindo: DownThe Road Apiece - Rolling Stones - Now]
Um comentário:
Interessante esse conto.
Gostei!
Postar um comentário